terça-feira, 23 de março de 2010

Pura serendipidade


Acredito no que se move. Na dinâmica da relação entre os termos. Como, por exemplo, som e silêncio. A interdependência desses dois termos produz um movimento intermitente. Como um diálogo. Um termo é fundamental para a existência do outro. Essa dinâmica produz o que talvez seja a única coisa constante que conheço. A mudança. Uma intermitência perene.

Dentro dessa dinâmica se movem as coisas mais naturais que conhecemos, como as ondas do mar, as dúvidas, a música e porquê não a própria vida. A intermitência entre má sorte e boa sorte produz o acaso e nós vivemos nele.

Acredito nisso tudo como indivíduo que lida com as temporalidades e a sazonalidade da arte. Como quem caminha pela casualidade que faz produzir. Essa é a motricidade do processo de criação. Estar sujeito ao processo da criação artística é algo enriquecedor. Compreendo mais o tempo das coisas convivendo com a arte. Assim entendo melhor o tempo.

Lembro do poeta alemão Rainer Maria Rilke em um trecho das "Cartas a um jovem poeta":

"Deixar amadurecer inteiramente, no âmago de si, nas trevas do indizível e do inconsciente, do inacessível a seu próprio intelecto, cada impressão e cada germe de sentimento e aguardar com profunda humildade e paciência a hora do parto de uma nova claridade: só isto é viver artisticamente na compreensão e na criação.

Aí o tempo não serve de medida: um ano nada vale, dez anos não são nada. Ser artista não significa calcular e contar, mas sim amadurecer como a árvore que não apressa sua seiva e enfrenta tranquila as tempestades da primavera, sem medo de que depois dela não venha nenhum verão. O verão há de vir. Mas virá só para os pacientes, que aguardam num grande silêncio intrépido, como se diante deles estivesse a eternidade. Aprendo-o diariamente, no meio de dores a que sou agradecido: a paciência é tudo."



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